A aprovação do Projeto de Lei nº 847/2025 pela Câmara dos Deputados, na última segunda-feira (14), pode representar um marco para o sistema de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. A proposta, de autoria do senador Jaques Wagner (PT-BA), altera a Lei nº 11.540/2007, que regulamenta o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), e autoriza o uso do superávit financeiro do Fundo para a concessão de empréstimos.
Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a medida é estratégica para impulsionar a inovação tecnológica, ampliar a competitividade da indústria nacional e gerar benefícios sociais, econômicos e ambientais. O texto mantém o limite estabelecido pelo Novo Arcabouço Fiscal de 2023, que permite utilizar até 50% do total previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) para operações de crédito com recursos do FNDCT. A novidade é que o projeto autoriza também o uso de recursos excedentes de anos anteriores para financiar projetos, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
A estimativa é de que cerca de R$ 22 bilhões em superávit possam ser destravados e direcionados a iniciativas voltadas à inovação e ao desenvolvimento tecnológico.
A especialista de Desenvolvimento Industrial da CNI, Zil Miranda, reforça a relevância da proposta como vetor de transformação. Para ela, o projeto é uma vitória para o Sistema de Fomento e Inovação, por abrir possibilidades de ampliar os empréstimos às empresas para o desenvolvimento de soluções inovadoras. “Estamos falando de cerca de R$ 22 bilhões acumulados no Tesouro que passam a ter potencial de aplicação no desenvolvimento de tecnologias e de inovações no país. Então, essa é uma grande vitória. Há uma demanda represada por recursos e os próprios números da Finep nos sinalizam essa alta demanda”, destaca.
Segundo Zil, somente em 2024, a demanda da Finep superou R$ 23 bilhões, com apenas pouco mais de R$ 14 bilhões contratados. “Mesmo se a gente considerar que parte desses projetos não estivesse apta a receber o financiamento, são cerca de 10 bilhões não atendidos. E certamente há nesse volume projetos que ficaram de fora, devido à oferta limitada de financiamento”, analisa.
Além da demanda elevada, a especialista ressalta que as taxas de juros praticadas pela Finep são mais baixas do que as do mercado, o que torna o financiamento ainda mais atrativo. “Criar essas condições, que são trazidas pelo PL para o aumento do volume disponível para empréstimo, sinaliza que estão sendo buscadas saídas para alavancar ainda mais o investimento privado em áreas relevantes para o país, conforme indicado na própria política industrial, a NIB (Nova Indústria Brasil)”, pontua.
ABDE comemora avanço e reforça impacto no setor produtivo
A Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) celebrou a aprovação do PL e destacou que a liberação desses recursos representa um avanço significativo na agenda de financiamento ao desenvolvimento. Para a entidade, os recursos permitirão a ampliação de programas estratégicos, como o Inovacred, operado pela Finep em parceria com instituições financeiras do Sistema Nacional de Fomento, voltado ao financiamento de projetos inovadores em diversos setores da economia.
O diretor executivo da ABDE, André Godoy, destaca que a mudança permitirá crédito a cooperativas e empresas de todos os portes, em setores como indústria, agropecuária, saúde, tecnologia da informação, comunicação, química, energia e aeronáutica. “São recursos importantes que vão para projetos do Brasil inteiro. O Sistema Nacional de Fomento já opera os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico junto às empresas. Então, são instituições que já têm recursos humanos capacitados para poderem fazer análise de projetos de inovação, de curva tecnológica, todos os aspectos relacionados a um projeto dessa natureza”, afirma Godoy.
Ele lembra que o sistema já opera com recursos do FNDCT há mais de 10 anos e que a ABDE atua constantemente na capacitação e certificação dos agentes financeiros para garantir que os financiamentos de inovação gerem resultados efetivos para o país.
Além disso, Godoy destacou que a associação faz parte do Conselho Consultivo da FINEP. Segundo ele, essa participação pode estreitar os laços e identificar melhor as diretrizes do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da Finep na promoção da inovação no país. “A atuação da ABDE nesse sentido foi fundamental para a aprovação desse projeto, para trazer clareza sobre os reais benefícios de investimentos dessa natureza e a nossa expectativa é que esses recursos possam fluir para a sociedade, para as empresas brasileiras, trazendo muito mais dinamismo econômico e produtividade para o nosso país”, conclui.
A ABDE reforça que a proposta não apenas impulsiona a inovação, mas também contribui diretamente para o crescimento sustentável, o fortalecimento da base produtiva e a geração de empregos qualificados no Brasil.
Agora, o PL 847/2025 segue para sanção presidencial.
Evitar o desperdício no início da cadeia produtiva, garantir a maior utilização de produtos e materiais e regenerar sistemas naturais. É nesses três pilares que se baseia a economia circular: um conceito simples, fundado em fazer com que os materiais circulem com a maior vida útil possível.
A ideia é dar vida nova a algum objeto que antes iria para o lixo, ou fazer com que esse objeto — em vez de ser descartado — sirva como matéria-prima para a produção de um outro bem de consumo. Um exemplo disso são as garrafas pet, que se tornam matéria-prima para a fabricação de sacolas reutilizáveis, ou pneus que se transformam em pisos.
Um dos exemplos mais bem sucedidos de reciclagem e economia circular é o que o Brasil faz com relação ao alumínio. Dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alumínio (Abralatas) mostram que, em 2022, o país se tornou um dos maiores recicladores do mundo, reciclando 100% das latas usadas.
Cátilo Cândido, presidente-executivo da Abralatas, explica que os benefícios da economia circular vão além do meio ambiente. “A nossa indústria não se destaca pela reciclagem, mas é um produto que — num ciclo rápido de 60 dias, até virar uma lata novamente — gera inúmeros benefícios, não só ambientais, mas econômicos e sociais também.”
A reciclagem da latinha evitou a emissão de mais de 15 milhões de toneladas de gases de efeito estufa nos últimos 10 anos. Trabalho que movimenta cerca de R$ 6 bilhões por ano e gera emprego e renda para mais de 800 mil catadores em todo o país.
Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) mostram que metade da energia gerada no país é de fonte hídrica. Seguida pela geração solar fotovoltaica com 13,1%, e a eólica com 11,5%.
Segundo o economista e professor da FAAP-SP Sillas Souza, somos referência mundial quando o assunto é energia limpa. Nossa matriz energética, em geral, é renovável, o que faz do Brasil um player em economia circular.
“Enquanto o mundo ainda queima muito carvão, a gente usa água, um pouco de sol e cada vez usamos mais vento, nisso nós já somos mais ecológicos. Nós inventamos — em larga escala, o carro movido à álcool. A gente usa recursos naturais e renováveis enquanto o mundo usa esses recursos não-renováveis.”
A tecnologia Flex, desenvolvida para os carros brasileiros, é considerada como exemplo de economia circular, explica o professor.
Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos mostram que em 2022 foram gerados mais de 81 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos no Brasil. E 33,6% desse total são materiais que poderiam ser reciclados, como plástico, papel e papelão e vidros. Mas os dados oficiais — colhidos pelos serviços de limpeza urbana das prefeituras — mostram que apenas de 3 a 4% desse material é reciclado.
Número que pode ser bem menor do que o real, segundo Carlos Rossin, responsável pelo departamento técnico da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA).
“Como o setor na parte de reciclagem há um alto grau de informalidade, muitas vezes temos um controle de informações deficitário. No entanto, se a gente pudesse fazer um levantamento de todas as cooperativas ou pegar dados de outras estruturas — muitas delas informais — eu não tenho dúvida que os valores seriam muito superiores a esses.”
O Fórum da Geração Ecológica — que funcionou na Comissão de Meio Ambiente do Senado entre 2021 e 2022 — rendeu frutos. Um deles foi o PL 1874/22, criado para incentivar os setores público, privado e toda a sociedade a adotarem práticas da economia circular, ou seja, a utilizarem resíduos e priorizarem a não-geração deles.
No projeto, de relatoria do senador Jaques Wagner (PT-BA), um conjunto de medidas que fomentam a transição da economia linear para a circular, como a utilização das compras públicas, o incentivo ao desenvolvimento tecnológico para a otimização do aproveitamento dos materiais e a adoção do Mecanismo de Transição Justa, para apoiar os setores mais afetados pelas alterações promovidas pela economia circular.
“Para ser funcional, a transição deve ser integrada: indústria, serviços, comércio, consumidores. Com os órgãos públicos não deve ser diferente. Penso, aliás, que devemos dar o exemplo, estimulando a contratação de empresas através de requisitos de sustentabilidade, reaproveitamento e, obviamente, preço de compra”, explica o senador.
Jaques Wagner ainda acrescenta que o poder público tem que ser o primeiro a dar o exemplo para a sociedade, estimulando as empresas que querem contratar a fazerem a administração e a adoção de sistemas ecologicamente corretos.
A regulamentação do mercado de carbono foi aprovada por unanimidade, com apoio de diferentes setores políticos e econômicos, na Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado. Para o setor industrial, a implementação desse mercado é um dos principais pontos para o desenvolvimento de uma economia de baixo carbono. O gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Davi Bomtempo, argumenta que o PL 412/2022, que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), aproxima o Brasil da discussão sobre o mercado de carbono no mundo.
“O Brasil começa a entrar em uma fase de política pública, desenho institucional para que a gente possa avançar no mercado de carbono mais implementado e eficiente que seja conectado com o mercado internacional e o mais importante que isso seja feito por lei para que a gente possa ter clareza e segurança jurídica para quem quiser operar e fazer negócios aqui no Brasil”, afirma.
O projeto, de autoria do ex-senador Chiquinho Feitosa, foi aprovado na última quarta-feira (4) após acordo da relatora, senadora Leila Barros (PDT-DF), com a bancada do agronegócio para tirar o setor do SBCE. A senadora Tereza Cristina (PP-MS), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e ex-ministra da Agricultura, afirmou que a “FPA e a bancada do agronegócio estão muito confortáveis com a aprovação”. O líder do governo no Senado, senador Jaques Wagner (PT-BA), destacou o diálogo entre os diferentes atores para chegar ao texto aprovado.
“A matéria ainda vai para Câmara, havendo mudanças voltará ainda para essa Casa, evidentemente que o gosto do governo seria poder levar a posição de que a gente chegou à uma evolução, mesmo que não definitiva, para a COP de novembro, não sei se será possível, depende um pouco da Câmara. Mas eu quero dizer que, de qualquer forma, isso aqui é um avanço grande”, disse o parlamentar.
O projeto foi aprovado em caráter terminativo — quando não há necessidade de votação em plenário — e agora, caso não haja recurso de senadores, segue para análise da Câmara dos Deputados.
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Segundo nota técnica divulgada pela Câmara dos Deputados, a criação do mercado regulado de carbono é uma oportunidade para fortalecer a competitividade brasileira no mercado internacional,. De acordo com o documento, 48% da matriz energética brasileira tem participação de fontes renováveis, 83% se considerada apenas a matriz elétrica. Os números são favoráveis quando comparados às médias mundiais, de 15% e 29% respectivamente. Além disso, esse mercado deve contribuir para o Brasil cumprir compromissos climáticos.
A regulação do mercado de carbono tem avançado em vários países. O estudo traz informações do Banco Mundial que apontam 73 iniciativas de precificação de carbono no mundo. “Esta precificação implica custos que são arcados pelos setores produtivos destes países e repassados aos seus consumidores. Esses produtores reagem à concorrência vinda de outros países sem precificação de carbono, pressionando os governos dos seus próprios países a implementarem medidas por uma concorrência em condições mais favoráveis”, diz o documento.
A nota técnica da Câmara aponta que precificar o carbono por meio de um imposto pode proporcionar maior clareza sobre os custos. No entanto, a tributação não garante a queda das emissões e pode fazer com que o governo passe a depender de receitas das emissões de carbono. O estudo sugere que a reforma tributária (PEC 45/2019) em análise no Senado abre espaço para a eliminação de subsídios a combustíveis fósseis e aponta o mercado de carbono como uma ferramenta mais vantajosa que a tributação.
A reforma acrescenta ao rol de competências da União instituir impostos sobre produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. É o chamado imposto seletivo que vai ser introduzido na regra geral do imposto sobre valor agregado (IVA), com alíquotas maiores ou menores, considerando os impactos de determinado produto ou serviço na sociedade. O dispositivo depende de regulamentação.
A Câmara dos Deputados vai analisar um projeto de lei que estabelece o marco legal dos bioinsumos. O texto traz diretrizes sobre a produção, o registro, a comercialização e incentivos à produção de bioinsumos para a agricultura, entre outros aspectos.
O senador Jaques Wagner (PT-BA), autor do PL 3668/21, cita em sua justificativa estudo que aponta uma movimentação anual de R$ 1 bilhão do setor de bioinsumos no Brasil. Segundo o parlamentar, estima-se que em 2025 o segmento de insumos biológicos deve ultrapassar US$ 8 bilhões em todo o mundo.
Os bioinsumos são definidos como produtos, processos ou tecnologias de origem vegetal, animal ou microbiana, para o uso na produção de produtos agropecuários. Ou seja, são produtos de origem natural que podem ser usados em substituição aos defensivos agrícolas e fertilizantes tradicionais.
O advogado especialista em direito ambiental Alexandre Aroeira avalia que o marco legal proporciona segurança jurídica para a produção, além de trazer benefícios à saúde humana.
O especialista argumenta que a utilização dos bioinsumos impacta de maneira positiva também no meio ambiente, por se tratar de produtos mais aderentes à própria natureza.
“Então é um ganho ao meio ambiente, por isso que muito aplaudido e quase uma unanimidade na discussão sobre a utilização dos bioinsumos. É óbvio que você também não pode deixar totalmente solto porque se mal usado, sem orientação e sem regra, pode gerar algum tipo de dano à fauna, à flora e até ao ser humano. Mas, em um aspecto geral, é extremamente favorável e positivo ao meio ambiente. Você polui muito menos e não joga na natureza produtos artificiais”, destaca o especialista.
Dentre outras medidas, PL 3668/21 prevê regras para registro dos bioinsumos e de estabelecimentos que produzem ou importam o produto; permite a produção em estabelecimento rural sem a necessidade de registro; estabelece parâmetros para a produção e importação com o objetivo de garantir qualidade e segurança; e apresenta medidas para fomentar pesquisas relacionadas ao tema no país.
O projeto foi aprovado no Senado na última quarta-feira (20) na forma de substitutivo — que modifica o texto original de modo substancial — apresentado pelo relator, senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB).
No relatório, o senador pontua que o projeto é “extremamente oportuno, sobretudo para fomentar o investimento, dar garantia aos contratos de longo prazo, típicos desse segmento, e certamente para dar segurança jurídica e segurança sanitária para a sociedade brasileira e consumidores de todo o mundo”.
Em entrevista ao portal Brasil 61.com, o parlamentar destaca que as expectativas quanto aos impactos da proposta são as melhores possíveis. Para ele, o projeto proporciona segurança aos atores envolvidos, o que melhora as perspectivas de produção e exportação dos bioinsumos, além de possibilitar uma substituição progressiva de produtos químicos.
“Para a saúde humana, para atividades econômicas, para a segurança das relações, o projeto de bioinsumos eu penso que foi um avanço importante e que nós tivemos esse trabalho conjugando todas as participações. Foi um ano e meio, aproximadamente, de um debate com audiências públicas, ouvindo o Ministério da Agricultura, que será fundamental, ouvindo a Anvisa, ouvindo aos produtores, os empreendedores do agro e que terminou sendo um projeto construído e que ganhou ao final a sua unanimidade”, afirma.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai revogar os dois decretos que alteram pontos importantes do marco legal do saneamento (Lei 14.026/2020). Em reunião na tarde desta terça-feira (11), em Brasília, governo e oposição chegaram a um acordo antes que o PDL 98/2023 fosse votado no Plenário do Senado. O projeto, já aprovado na Câmara dos Deputados, prevê a sustação de alguns trechos dos decretos do Executivo. Com a promessa de revogação, o PDL 98 foi retirado de pauta, como explica o relator, senador Confúcio Moura (MDB-RO).
“Ficou acordado que os decretos serão revogados e, logicamente, o PDL perde a sua natureza e ele será julgado prejudicado. Com isso, não há necessidade de ter votação em Plenário, porque com a revogação automática se encerra o assunto”.
O líder do governo no Senado, senador Jaques Wagner (PT-BA), afirma que o governo entendeu a mensagem da Câmara e do Senado e, com isso, foi possível chegar a um denominador comum. Segundo o parlamentar, a Câmara deu sinal verde para a negociação e o novo decreto deve ser publicado até quinta-feira (13).
“O governo decidiu revogar os dois decretos, publicar dois novos, retirando todo o texto considerado ofensivo na forma de decreto. Ainda permaneceu um debate, vamos chamar jurídico-legislativo, em relação ao prazo, que nesse decreto atual vai até 31 de dezembro de 2023 para que os municípios e as empresas pudessem comprovar a sua capacidade financeira”, explica o senador.
Para o líder da oposição no Senado, senador Rogério Marinho (PL-RN), os decretos, publicados pelo governo no início de abril, vão “contra o espírito da lei”. O senador destaca os impactos positivos do marco do saneamento e lembra que a lei foi amplamente discutida no Congresso Nacional. À época, Marinho era ministro do Desenvolvimento Regional do ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Nós estávamos preocupados porque o decreto, na nossa opinião, além de ferir a lei — e o que nós queríamos preservar é a instituição — permitia que as companhias estatais pudessem intervir, sem licitação, nas regiões metropolitanas, contra o espírito da lei. Permitia a regularização dos contratos precários e a introdução desses contratos dentro do acervo dessas companhias para melhorar a sua condição na obtenção de pontos na questão financeira e econômica para atender as metas de universalização em 2033”, argumenta o parlamentar.
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O projeto da Câmara susta, no decreto 11.466, a possibilidade de utilização de contratos provisórios não formalizados, irregulares ou precários para a comprovação da capacidade econômico-financeira. O trecho é contrário ao marco do saneamento, que define como contratos regulares aqueles que atendem aos dispositivos legais pertinentes à prestação de serviços públicos de saneamento básico.
Além disso, o marco regulatório considera irregulares e precários os contratos provisórios, não formalizados e os vigentes em desconformidade com os regramentos estabelecidos. Outro ponto sustado pelos deputados é a dilatação do prazo para comprovação de capacidade econômico-financeira, prorrogado de dezembro de 2021 para o fim de 2023.
O marco legal do saneamento define prestação regionalizada como “a modalidade de prestação integrada de um ou mais componentes dos serviços públicos de saneamento básico em determinada região cujo território abranja mais de um município”. O mecanismo, na prática, organiza estruturas intermunicipais para promover a sustentabilidade econômica, a criação de ganhos de escala e de eficiência, além da universalização dos serviços.
Sobre o tema, o PDL 98/23 suspende cinco dispositivos do decreto 11.467, publicado pelo Executivo. Dentre eles, a possibilidade de prestação dos serviços de saneamento básico por companhia estatal estadual, sem a necessidade de licitação. Conforme o marco legal do saneamento, a prestação dos serviços públicos de saneamento básico por entidade que não integre a administração do titular — no caso, o próprio município — depende da celebração de contrato de concessão, mediante prévia licitação.
Na prática, o dispositivo permitia que municípios integrantes de uma estrutura regionalizada deleguem a execução de serviços de saneamento, sem licitação, a companhias controladas pelo estado, o que contraria o marco regulatório.
A Lei 14.026/2020 estabelece que, até 2033, 99% da população brasileira deve ter acesso à rede de água tratada e 90% à coleta e ao tratamento de esgoto. A legislação prevê mecanismos como investimentos do setor privado para viabilizar as metas. De acordo com os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, 96 milhões de pessoas não possuem acesso à rede de esgoto e 36,3 milhões não têm acesso ao abastecimento de água.
Estudo divulgado pelo Instituto Trata Brasil aponta que o equivalente a 5 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento é despejado na natureza no Brasil, desde 2021. Além disso, 14,3% das crianças e adolescentes não possuem o direito à água garantido.
A economia circular é marcada pela circularidade dos resíduos. A ideia é que aquele produto que seria queimado ou iria para o lixo retorne à cadeia como um novo item ou sirva como matéria-prima para a produção de um outro bem de consumo. Um pneu velho, por exemplo, pode ser aproveitado para a produção de tapetes, solas de calçados ou borracha granulada que, por sua vez, serve como matéria-prima para a fabricação de pisos de quadras esportivas.
Segundo Patrícia Guarnieri, doutora em engenharia de produção pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com pós-doutorado em economia circular na Universidade de Bolonha, na Itália, a economia circular é um novo modelo de produção e consumo, cujo foco é a sustentabilidade. Ele é uma alternativa à chamada economia linear, que se caracteriza pela extração da matéria-prima, produção, consumo e o descarte.
Tramita no Senado Federal um projeto de lei que cria a Política Nacional da Economia Circular. De autoria da Comissão de Meio Ambiente (CMA), o PL 1874/2022 tem o objetivo de incentivar o poder público, o setor privado e os consumidores a adotarem práticas que priorizem a não geração, a redução e a reutilização de resíduos.
Relator do projeto de lei, o senador Jaques Wagner (PT-BA) diz que a proposta nasceu no Fórum da Geração Ecológica, que funcionou na CMA entre 2021 e 2022, e reuniu 42 representantes, desde acadêmicos até industriais.
"Quando falamos de uma cadeia produtiva circular, estamos olhando desde o nascimento da matéria-prima, que mantenha as florestas de pé, até a reutilização do que, hoje, chamamos de lixo. Quando chegarmos nesse patamar de circularidade, significa que vamos ter um país mais desenvolvido, com mais tecnologias e ao mesmo tempo sustentável", acredita.
Jaques Wagner explica que a economia circular não é uma proposta que se restringe às cidades. "Ela poderá funcionar, seja no campo ou nas cidades. Por exemplo, no campo, podemos produzir insumos para indústrias substituírem materiais e produtos que hoje vêm do petróleo. Ou seja, podemos fazer plásticos, químicos em geral, originados de plantas e frutos da nossa biodiversidade. Ao mesmo tempo, depois que esses materiais forem utilizados, a cadeira de reúso deles precisa estar bem construída, fazendo com que a reciclagem, uso como adubo e até energia sejam possíveis".
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O projeto de lei estabelece alguns instrumentos para fomentar a transição da economia linear para a economia circular. O texto propõe a criação do Fórum Nacional de Economia Circular, colegiado composto por autoridades e representantes do setor produtivo e da sociedade civil. Ele teria o papel de elaborar planos de ação, conscientizar e mobilizar a sociedade para discutir as iniciativas necessárias para promover a economia circular.
A proposta passa a incluir na Lei de Licitações e Contratos Administrativos um artigo que exige que a licitação para compra ou contratação de bens e serviços pela administração pública, incluindo os de engenharia, deva seguir o princípio da sustentabilidade.
O texto também sugere que a incorporação de requisitos de sustentabilidade, considerando o poder de compra e os custos, também passe a figurar entre os objetivos do processo de licitação. Segundo o relator do projeto de lei, senador Jaques Wagner (PT-BA), o poder público precisa ser vanguarda na transição para a economia circular.
"Devemos dar o exemplo, estimulando a contratação de empresas através de requisitos de sustentabilidade, reaproveitamento e, obviamente, preço de compra. Ao mesmo tempo que damos o exemplo para a sociedade do compromisso dos agentes públicos, estimulamos as empresas que querem contratar com a administração a adoção de sistemas ecologicamente corretos", espera.
Outro pilar da Política Nacional de Economia Circular proposta é o Mecanismo de Transição Justa (MJT). O MJT funcionaria para apoiar as regiões e setores mais afetados pela transição para o novo modelo de produção e consumo. No caso de indústrias com alta emissão de carbono, o mecanismo deve apoiar mudanças para o uso de tecnologias de baixo carbono. Para isso, teria de criar condições atrativas para investimento; facilitar o acesso a empréstimos e financiamentos; investir na criação de startups e em atividades de pesquisa e inovação.
"Empresas precisam de adequação; profissionais, de capacitação; consumidores, de conscientização. É criar mecanismos legais e tributários que estimulem o mercado a se adaptar e minimizar os impactos negativos para a geração de trabalho, emprego e renda, sem onerar a cadeia produtiva", explica o senador.
Para Guarnieri, a indústria será importante para a transição rumo à economia circular. “A indústria tem um papel essencial no sentido de promover o retorno do resíduo para que ele possa ser reinserido no processo produtivo dela própria como, também, em outros processos produtivos. É na indústria que surgem as principais iniciativas de inovação. Então a indústria vai ter que olhar pra dentro e analisar o seu produto e verificar formas de inovar para que possa fazê-lo de uma forma mais adequada, para que gere menos resíduos lá na ponta, menos recursos energéticos.”
O PL diz que o poder público terá que incentivar a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação de tecnologias, processos e novos modelos de negócios que incentivem a circularidade.
Segundo projeto de lei, 30% dos recursos do Programa de Inovação para Competitividade e 20% do rendimento anual do Fundo Social passariam a ser aplicados em iniciativas voltadas para a economia circular.
O presidente Jair Bolsonaro sancionou, nesta segunda-feira (10), o projeto que regulamenta a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações interestaduais. A nova lei partiu do substitutivo ao PLP 32/2021, de autoria do senador Cid Gomes (PDT-CE), que destaca a importância da medida.
“Essa matéria é fundamental para todos os estados. Hoje, pelo menos 23 estados recebem mercadoria de três ou quatro estados brasileiros. Isso já é praxe. Os estados que enviam a mercadoria ficam com um percentual do ICMS e os que recebem ficam com outros percentual”, explica.
O senador Jaques Wagner (PT-BA), esclareceu que a medida sancionada não representa um aumento de custo para as companhias. “Não há perda para ninguém, porque assim já é feito. Apenas estamos cumprindo a determinação do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que, para a continuidade da cobrança, era necessária essa Lei Complementar”, destaca.
As especificações por lei complementar eram necessárias desde 2015. Na época, uma Emenda Constitucional criou regras para as empresas pagarem o tributo à Unidade da Federação que recebia o produto ou serviço.
Até o fim de 2021, a cobrança do ICMS em operações entre estados era regida por um convênio estabelecido no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) exigiu a edição de uma lei complementar para regulamentar a questão. A vigência do convênio terminou no ano passado, porém, a nova lei só vai passar a valer dentro de 90 dias, já que se trata de regra tributária.
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Além disso, por conta do crescimento do comércio eletrônico nos últimos anos, fica regulamentado por lei que a empresa que vender para um cidadão comum paga a diferença de alíquotas para o estado onde vai a mercadoria. Porém, caso a transação seja feita entre empresas de estados distintos, a pessoa jurídica recebedora do produto é quem deverá pagar o imposto ao seu estado.
Por conta do coronavírus, a comissão mista especial que analisa a reforma tributária no Congresso Nacional paralisou, por tempo indeterminado, as discussões do texto que atualizará o modelo de cobrança de impostos no Brasil.
Na avaliação do deputado federal João Roma (Republicanos-BA), o debate sobre o tema deve ser restabelecido assim que a pandemia estiver sob controle e não houver riscos à saúde de parlamentares e funcionários do Legislativo. Ele defende a simplificação tributária e considera um avanço a criação do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS), que une tributos federais, estaduais e municipais em um só.
“Sem dúvida nenhuma, os países que estão dando certo adotam essa modelagem. A estrutura brasileira é lastreada no imposto de maior arrecadação, que é o ICMS, e é obsoleta, não condiz com a realidade atual. Também não consegue ser abrangente adequadamente e, muito menos, ser justa”, critica Roma.
O IBS sugerido para o Brasil, previsto nas propostas de emenda à Constituição que tramitam na Câmara e no Senado, é baseado no Imposto sobre Valor Adicionado (IVA), utilizado pela maioria dos países desenvolvidos para a tributação do consumo de bens e serviços.
A principal mudança em relação ao que ocorre hoje é que, durante a cadeia produtiva, todo imposto pago pelos fornecedores vai gerar crédito para a próxima venda desse produto, evitando a cumulatividade das cobranças - principal alvo de críticas do setor produtivo.
O senador Jaques Wagner (PT-BA) também concorda que é preciso enxugar impostos no país, mas opina que o Parlamento terá um grande desafio pela frente até chegar a um consenso sobre o tema, de modo que estados e municípios não sejam prejudicados economicamente.
“Para mim, no aspecto da simplificação, a reforma seria fundamental. [O problema é que] reforma tributária sempre é complexa, porque todo mundo quer, mas cada um tem a sua. Então, não é uma coisa simples”, pondera.
Unificação de impostos
A principal medida comum dos textos de reforma tributária é a unificação da cobrança de impostos sobre bens e serviços nos estados, municípios e governo federal, e, em contrapartida, a criação o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo (IS).
A fórmula de arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) também deve ser revista pelos parlamentares da comissão mista da reforma tributária. A princípio, a ideia de deputados e senadores é agregar essa tributação ao IBS, com alíquota padronizada em todos os entes da federação, com parte do valor flexível e sob competência dos estados, como prevê o texto da PEC 45/2019.
Além disso, a cobrança do imposto estadual deve ter a dinâmica invertida. No modelo atual, o ICMS é cobrado no estado onde o produto é fabricado. Com a criação do IBS, o tributo passa a ser retido no destino da mercadoria. A tática pode contribuir para diminuir a “guerra fiscal” e tornar a concorrência mais justa entre as unidades da Federação.
“Hoje, o cidadão paga, quando compra uma moto, por exemplo, tributo na cidade e estado onde comprou e nos entes em que foram produzidos o produto. Com a tributação só no destino, reduz a complexidade e isso permitirá maior eficiência do Estado”, acredita o deputado federal Afonso Florence (PT-BA).
A expectativa inicial do relator, deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), era de que o parecer fosse apresentado na comissão no fim de abril, mas isso deve ser protelado diante da paralisação parcial das atividades no Congresso Nacional.